UFSC na mídia: Como ficam as universidades públicas de Joinville com bloqueio e corte de verba
Desde o final de abril, quando o Ministério da Educação (MEC) anunciou um contingenciamento (bloqueio) de 30% dos recursos destinados a cada universidade e instituto federais, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) se preocupam quanto à sua capacidade de continuar atividades, especialmente de pesquisa e extensão, e conceder bolsas aos estudantes.
Na quarta-feira (15/5) ocorreram manifestações em todo País contra o bloqueio de recursos para a educação. Em Joinville, estudantes da UFSC, Udesc e IFSC, além de alunos de instituições particulares e também secundaristas, se juntaram na Praça da Bandeira, às 15 horas, e em frente à Udesc e Univille, às 19 horas, para atos de repúdio. Segundo a Polícia Militar, 400 pessoas estiveram na praça. Para os organizadores do evento, foram 2 mil. Na frente das universidades, estudantes estimaram a participação de 800 pessoas.
O primeiro anúncio veio no dia 30 de abril, em entrevista do ministro da educação, Abraham Weintraub, ao jornal “O Estado de São Paulo”. Na ocasião, ele afirmou que iria cortar verba de universidades que não tivessem um bom desempenho acadêmico e estivessem promovendo “balbúrdia”, citando três instituições que já teriam tido diminuição de repasses: a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade de Brasília (UnB), e a Universidade Federal Fluminense (UFF).
No entanto, as universidades mencionadas estão entre as 50 melhores da América Latina segundo o principal ranking universitário internacional, o Times Higher Education (THE). A UnB estava na 16º posição, em 2018; a UFBA passou na 30ª; e a UFF em 45º.
Embora o ministro tenha associado o contingenciamento de recursos a universidades que promoveriam “balbúrdia” e teriam desempenho insatisfatório, outras universidades já tinham tido recursos bloqueados naquela ocasião.
O contingenciamento foi uma medida adotada após a equipe econômica do governo federal estabelecer o congelamento de R$ 30 bilhões de gastos, para garantir o cumprimento da meta fiscal. Desse total, R$ 5,8 bilhões virão do MEC.
Despesas obrigatórias e não obrigatórias
Segundo o pró-reitor de educação da UFSC, Alexandre Marino Costa, não é a primeira vez que a verba é contingenciada. Todo começo de ano é comum que haja um bloqueio até que se verifique como está a entrada de receitas, através do pagamento de impostos, no País. Mas ele não se recorda de ter tido alguma ocasião em que o contingenciamento de recursos tenha sido da ordem de 30%.
As despesas das universidades se dividem em dois tipos: as não obrigatórias (também chamadas de discricionárias) e as obrigatórias. O bloqueio de recursos realizado pelo Ministério da Educação é sobre as despesas não obrigatórias, que representam cerca de 20% de tudo que a universidade precisa pagar.
A grande parte das despesas, que são obrigatórias, é para pagamento do salário dos servidores e dos aposentados. Essas não podem sofrer cortes.
“Há a impressão de que as universidades têm muitos recursos, mas a grande parte é para pagamento de salários e de inativos. Essa fatia não é gerenciável pela universidade”, afirma Alexandre.
O restante dos recursos das instituições é para o pagamento das despesas não obrigatórias, que se dividem em: custeio e investimento. As despesas para custeio incluem água, luz, serviços terceirizados (como limpeza, segurança e restaurante universitário), compra e manutenção de equipamentos para laboratórios, bolsas acadêmicas e insumos para pesquisas. São os recursos para pagamento dessas despesas que o ministério bloqueou.
Professores e pró-reitores das instituições afirmam que serviços como segurança, limpeza e restaurante universitário (RU) foram licitados e não podem ser reduzidos. As instituições também não podem correr o risco de terem serviço de luz e água comprometidos, o que afetaria diretamente as aulas.
“Enquanto tivermos condição de segurança e higiene, nossas aulas serão mantidas”, afirma o coordenador de pesquisa da UFSC Joinville, Wagner Maurício Pachekoski.
Diferentes cenários
Os gestores da educação estão trabalhando com diferentes cenários: (o pessimista) em que o contingenciamento se mantenha e a verba não chegue às instituições; (o meio termo) em que haja diminuição de repasse, mas que não chegue a 30%; (o otimista) em que o ministério volte atrás e libere a verba.
Em audiência na Comissão de Educação no Senado, no início de maio, Abraham Weintraub disse que os recursos podem ser liberados se a reforma da Previdência for aprovada e se a economia melhorar no segundo semestre.
Na quarta-feira (15), na Câmara dos Deputados, o ministro voltou a defender a educação básica (ensino infantil, fundamental e médio) como prioritário. Mas a área também sofreu contingenciamento de recursos.
Caso Udesc
A Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) é uma universidade estadual e não recebe repasses do governo federal. No entanto, a instituição também pode sofrer corte de recursos.
A verba destinada à universidade vem do duodécimo do governo de Santa Catarina, ou seja, a receita líquida corrente do Estado dividida em 12 partes. Vários órgãos recebem um percentual do duodécimo: Tribunal de Justiça de Santa Catarina (9,41%); Assembleia Legislativa (4,34%); Ministério Público (3,98%); Udesc (2,49%); e Tribunal de Contas (1,66%).
O governador de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), enviou à Assembleia Legislativa do Estado, em abril, o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2020 prevendo redução de 10% no valor repassado do duodécimo. Se aprovado, esse percentual reduzirá em R$ 40 milhões o orçamento da universidade e, consequentemente, o valor repassado ao campus de Joinville.
A justificativa é usar esse dinheiro para outros serviços, como segurança e saúde. Um dos argumentos do governo é que parte do repasse feito aos órgãos sempre é devolvida no final do ano, o que significaria que eles não estariam usando toda a verba destinada.
Mas professores e gestores da Udesc defendem que a situação da universidade tem de ser olhada de outra forma. “Ele (o duodécimo) é tudo para a universidade. É todo o recurso que a universidade recebe”, afirma Cinara Terezinha Menegazzo, diretora de extensão do campus de Joinville da Udesc.
Segundo explicação da professora-diretora, o dinheiro da Udesc que volta para o governo no final do ano não é sobra. É um dinheiro que já está comprometido para o pagamento de fornecedores, por exemplo, que ganharam alguma licitação, mas só entregarão o material ou executarão um serviço no ano seguinte.
O dinheiro do duodécimo que não for utilizado no ano vigente volta para o governo. “Não é dinheiro que sobrou, no caso da Udesc. É um dinheiro que já está comprometido. Ele vai (para o governo) na expectativa de que volte (para a universidade)”, explica.
No caso da Udesc, a redução do repasse pelo Estado não livra os salários dos funcionários da universidade. “Se a receita é menor, o quantitativo que precisaremos destinar ao salário é maior (tendo em vista que os salários não podem ser reduzidos) e pode ultrapassar o valor máximo em folha e causar problemas para a universidade”, explica Cinara.
Reuniões com vereadores e deputados estaduais
Desde o anúncio da proposta de diminuição do repasse, a Udesc Joinville se mantém em reunião com vereadores e deputados estaduais para buscar apoio e explicar como funciona a instituição e o que pode ficar comprometido caso o orçamento seja 10% menor.
“A gente tem recebido apoios importantes, mas também tem sentido restrições. De quem a gente acha que vem propostas novas, de uma governança diferenciada, no momento que não consegue enxergar a importância de uma universidade pública, de onde se faz conhecimento e do que é conhecimento para a sociedade e para um país, isso nos decepciona bastante. Mas nós temos recebido muito apoio”, Cinara.
Pontos sensíveis: pesquisas científicas e ações de extensão
Além de transmitir conhecimento, o que caracteriza uma instituição de ensino como universidade é o dever que ela tem de produzir novos conhecimentos, ou seja, descobrir fatos novos. Por isso, todas as universidades trabalham com um tripé educacional: o ensino, a pesquisa e a extensão.
O ensino é matéria básica da aprendizagem, são as aulas regulares, nas quais há a transmissão de conhecimento entre professores e estudantes.
A pesquisa é um trabalho de geração de conhecimento baseado no método científico. Você tem um problema, cria hipóteses a serem pesquisadas sobre esse problema e, através de metodologias de estudo, busca chegar a uma solução para ele.
A extensão inclui atividades que promovem a interação entre a universidade e a comunidade externa. Ela pode ser um programa amplo e interdisciplinar; um projeto; cursos; eventos ou prestação de serviços. Seu objetivo é incentivar o diálogo entre a universidade e a sociedade e transmitir saberes.
É, especialmente, através das pesquisas e da extensão que as universidades atingem a comunidade que não está diretamente ligada a elas, ou seja, que não são seus estudantes. Mas são justamente esses áreas que ficam mais comprometidas quando há uma situação de corte ou contingenciamento de recursos para as universidades.
Isso porque normalmente são as primeiras a terem verbas diminuídas dentro das instituições na tentativa de manter intacto o ensino regular nas salas de aula.
Existem outras formas de financiar pesquisas: através de editais, de verbas de ministérios, de convênios com empresas, entre outras. Mas é da verba de custeio das universidades que sai o dinheiro para manutenção de laboratórios, compra de equipamentos e bolsas estudantis.
Por jornalista Patricia Gaglioti
Da equipe Fazer Aqui
Imagem: Fazer Aqui.
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